Garantia da Lei e da Ordem - Parte VIII: breves comentários a respeito do art. 15 da Lei Complementa
- Claudio Alves
- 23 de ago. de 2017
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A Lei Complementar Nr 97, de 9 de junho 99, já alterada em 2004 e 2010, respectivamente, pelas Leis Complementares Nr117 e Nr136, é a norma legal que trata do preparo e do emprego das Forças Armadas.
Nessa lei, está gizado que o emprego em GLO se dá da seguinte forma:
Art. 15. O emprego das Forças Armadas na defesa da Pátria e na garantia dos poderes constitucionais, da lei e da ordem, e na participação em operações de paz, é de responsabilidade do Presidente da República, que determinará ao Ministro de Estado da Defesa a ativação de órgãos operacionais, observada a seguinte forma de subordinação:
I - ao Comandante Supremo, por intermédio do Ministro de Estado da Defesa, no caso de Comandos conjuntos, compostos por meios adjudicados pelas Forças Armadas e, quando necessário, por outros órgãos; (Redação dada pela Lei Complementar Nr 136, de 2010).
II - diretamente ao Ministro de Estado da Defesa, para fim de adestramento, em operações conjuntas, ou por ocasião da participação brasileira em operações de paz; (Redação dada pela Lei Complementar Nr 136, de 2010).
III - diretamente ao respectivo Comandante da Força, respeitada a direção superior do Ministro de Estado da Defesa, no caso de emprego isolado de meios de uma única Força.
§ 1o Compete ao Presidente da República a decisão do emprego das Forças Armadas, por iniciativa própria ou em atendimento a pedido manifestado por quaisquer dos poderes constitucionais, por intermédio dos Presidentes do Supremo Tribunal Federal, do Senado Federal ou da Câmara dos Deputados.
§ 2o A atuação das Forças Armadas, na garantia da lei e da ordem, por iniciativa de quaisquer dos poderes constitucionais, ocorrerá de acordo com as diretrizes baixadas em ato do Presidente da República, após esgotados os instrumentos destinados à preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, relacionados no art. 144 da Constituição Federal.
§ 3o Consideram-se esgotados os instrumentos relacionados no art. 144 da Constituição Federal quando, em determinado momento, forem eles formalmente reconhecidos pelo respectivo Chefe do Poder Executivo Federal ou Estadual como indisponíveis, inexistentes ou insuficientes ao desempenho regular de sua missão constitucional. (Incluído pela Lei Complementar Nr 117, de 2004)
§ 4o Na hipótese de emprego nas condições previstas no § 3o deste artigo, após mensagem do Presidente da República, serão ativados os órgãos operacionais das Forças Armadas, que desenvolverão, de forma episódica, em área previamente estabelecida e por tempo limitado, as ações de caráter preventivo e repressivo necessárias para assegurar o resultado das operações na garantia da lei e da ordem.
§ 5o Determinado o emprego das Forças Armadas na garantia da lei e da ordem, caberá à autoridade competente, mediante ato formal, transferir o controle operacional dos órgãos de segurança pública necessários ao desenvolvimento das ações para a autoridade encarregada das operações, a qual deverá constituir um centro de coordenação de operações, composto por representantes dos órgãos públicos sob seu controle operacional ou com interesses afins. (Incluído pela Lei Complementar Nr 117, de 2004)
§ 6o Considera-se controle operacional, para fins de aplicação desta Lei Complementar, o poder conferido à autoridade encarregada das operações, para atribuir e coordenar missões ou tarefas específicas a serem desempenhadas por efetivos dos órgãos de segurança pública, obedecidas as suas competências constitucionais ou legais.
§ 7o A atuação do militar nos casos previstos nos arts. 13, 14, 15, 16-A, nos incisos IV e V do art. 17, no inciso III do art. 17-A, nos incisos VI e VII do art. 18, nas atividades de defesa civil a que se refere o art. 16 desta Lei Complementar e noinciso XIV do art. 23 da Lei no4.737, de 15 de julho de 1965 (Código Eleitoral), é considerada atividade militar para os fins do art.124 da Constituição Federal. (Redação dada pela Lei Complementar Nr 136, de 2010).
O artigo 15 da Lei Complementar Nr 97/99 determinas as perfeitas diretrizes que devem ser observadas para o emprego das Forças Armadas em uma Op GLO.
A lei não poderia obrar de outra maneira, eis que garantir a lei e a ordem são missões precípuas e constitucionais dos órgãos de segurança pública, especialmente criados pela Constituição Federal para este exclusivo fim. Apenas em situações de anormalidade, nas quais os Órgãos de Segurança Pública (OSP) encontram-se indisponíveis, inexistentes ou insuficientes é que as Forças Armadas podem atuar no mister da segurança pública, consoante já visto anteriormente.
Da leitura do artigo 15 da Lei Complementar Nr 97/99, pode-se aferir que os requisitos legais para emprego das Forças Armadas, em ações de garantia de lei e da ordem, são os seguintes:
1) Determinação formal do Presidente da República, por intermédio de mensagem;
2) Esgotamento formal dos Órgãos de Segurança Pública (OSP) da Unidade da Federação;
3) Atuação das Forças Armadas de maneira episódica, em área previamente estabelecida e por tempo limitado; e
4) Transferência, mediante ato formal, do controle operacional dos OSP necessários à missão ao Coordenador das Operações.
O primeiro requisito para o emprego das Forças Armadas em Op GLO é a determinação formal do Presidente da República, por intermédio de mensagem.
Pode-se concluir que, para a legalidade do emprego do Exército Brasileiro, da Marinha do Brasil ou da Força Aérea Brasileira em Op GLO, é mister a existência da mensagem do Presidente da República que determina formalmente o emprego da tropa. Não pode o Ministro de Estado da Defesa determinar ao Comandante do Exército o emprego da Força, a menos que haja a mensagem do Presidente da República nesse sentido.
Note-se que há uma clara determinação da Lei Complementar Nr 97/99 exigindo a mensagem do Presidente da República para atuação das Forças Armadas na garantia da lei e da ordem.
Ressalto que a Constituição, em seu art. 1º, proclama que a República Federativa do Brasil se constitui em Estado Democrático de Direito. Ora, o Estado Democrático Direito tem como princípio basilar o princípio da legalidade. É de sua essência a subordinação à Constituição e às leis. Assim sendo, somente nas condições previstas em lei é que as Forças Armadas poderão atuar em Op GLO. E uma dessas condições é a determinação formal de emprego das Forças Armadas mediante mensagem do Presidente da República.
Neste sentido, deve ser conjugado o § 4º do art. 15 da Lei Complementar Nr 97/99 com o conteúdo do art. 7º, I, do Decreto Nr 3.897/01:
Art. 7º Nas hipóteses de emprego das Forças Armadas na garantia da lei e da ordem, constitui incumbência:
I - do Ministério da Defesa, especialmente:
a) empregar as Forças Armadas em operações decorrentes de decisão do Presidente da República;
Assim sendo, o Ministro da Defesa empregará as Forças Armadas, na forma do art. 7º, I do Dec. Nr 3.897/01, depois que o Presidente da República expedir a mensagem exigida pelo § 4º do Art. 15 da Lei Complementar Nr 97/99.
Ora, o Decreto regulamenta e observa os preceitos contidos na Lei Complementar, não podendo contrariá-la. Por essa razão, não se pode admitir interpretação no sentido de que o Decreto Nr 3.897/01 autoriza o Ministro da Defesa a realizar o emprego sem a mensagem presidencial prevista na Lei Complementar Nr 97/99.
Assim, inexistente a mensagem do Presidente da República, a eventual ordem de emprego expedida pelo Ministro da Defesa não ampara a atuação da tropa.
Efeito prático dessa situação é que toda a atuação da tropa, sem a mensagem presidencial, passa a revestir-se de ilegalidade, ficando à mercê de questionamentos judiciais, de modo que as condutas tipificadas como crime, que sejam a ela imputadas, serão havidas como crimes comuns e os delitos contra ela cometidos poderão ou não vir a ser considerados crimes militares.
O segundo requisito para o emprego das Forças Armadas na garantia da lei e da ordem, consoante a Lei Complementar Nr 97/99, é o esgotamento formal dos órgãos de segurança pública. A Lei exige que o Chefe do Executivo Estadual ou Federal declare formalmente como indisponíveis, inexistentes ou insuficientes os órgãos de segurança pública de uma dada Unidade da Federação.
Segundo o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, insuficiência é a característica ou estado do que é insuficiente; a incapacidade para executar uma tarefa, para ocupar um cargo; incapacidade de um órgão para executar suas funções. Inexistência, por outro bordo, é a não existência; ausência do que se supunha existir; carência. Indisponibilidade é a qualidade do que é indisponível, ou seja, o que não é disponível, está ocupado, não está livre, está impedido.
Assim, para o emprego das Forças Armas em Op GLO interessa o reconhecimento do esgotamento dos órgãos de segurança pública feita pelo Chefe do Poder Executivo Federal ou Estadual.
O terceiro requisito para o emprego das Forças Armadas na garantia da lei e da ordem é a atuação das Forças Armadas de maneira episódica, em área previamente estabelecida e por tempo limitado. Episódico é aquilo que acontece de forma eventual, ou inesperada, acidental, fortuita, incidental, ocasional.
Ao empregar a expressão “forma episódica”, a Lei Complementar demonstra que a atuação das Forças Armadas em garantia da lei e da ordem não pode se converter em algo corriqueiro, habitual, contumaz.
A intenção do legislador, ao fixar limites para a atuação das Forças Armadas, não é desarrazoada, pois a Constituição define que a instituição do estado de defesa e do estado de sítio (na hipótese de comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa – Art. 137, I) devem ser fixados no tempo e espaço:
Art. 136. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, decretar estado de defesa para preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza.
§ 1º - O decreto que instituir o estado de defesa determinará o tempo de sua duração, especificará as áreas a serem abrangidas e indicará, nos termos e limites da lei, as medidas coercitivas a vigorarem, dentre as seguintes:
(...)
Art. 138. O decreto do estado de sítio indicará sua duração, as normas necessárias a sua execução e as garantias constitucionais que ficarão suspensas, e, depois de publicado, o Presidente da República designará o executor das medidas específicas e as áreas abrangidas.
§ 1º - O estado de sítio, no caso do art. 137, I, não poderá ser decretado por mais de trinta dias, nem prorrogado, de cada vez, por prazo superior; no do inciso II, poderá ser decretado por todo o tempo que perdurar a guerra ou a agressão armada estrangeira.
(...)
Por isso o ato formal do Presidente da República, expedido por mensagem como já mencionado anteriormente, fixará limites temporais e geográficos de atuação da tropa de forma episódica. Isto porque a atuação das Forças Armadas em garantia da lei e da ordem é também uma forma de defesa do Estado e das Instituições Democráticas, tal qual o são o estado de sítio e o estado de defesa, previstos que estão tais institutos sob o mesmo Título V da Constituição.
O quarto requisito para emprego das Forças Armadas em garantia da lei e da ordem é a transferência, mediante ato formal, do controle operacional dos Órgãos de Segurança Pública (OSP) necessários à missão ao Coordenador das Operações.
Controle operacional é o poder conferido à autoridade encarregada das operações, para atribuir e coordenar missões ou tarefas específicas a serem desempenhadas por efetivos dos órgãos de segurança pública, obedecidas as suas competências constitucionais ou legais.
Por fim, resta comentar, quanto ao art. 15 da Lei Complementar Nr 97/99, a nova redação dada ao seu § 7º. Esse § 7º estabelece que os delitos cometidos contra os efetivos do Exército Brasileiro, Marinha do Brasil e Força Aérea Brasileira, empregados em Op GLO e, do mesmo modo, os delitos imputados a militares das Forças Armadas no transcorrer das ações serão crimes militares, desde que, por evidente, estejam previstos no Código Penal Militar (CPM) e sejam cometidos numa das hipóteses previstas no art. 9º do referido Diploma Legal.
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